ricardorosas rosas on Wed, 20 Sep 2006 22:24:24 +0200 (CEST) |
[Date Prev] [Date Next] [Thread Prev] [Thread Next] [Date Index] [Thread Index]
[nettime-br] Já existe uma teoria tática brasileira? |
EXISTE UMA "TEORIA TÁTICA BRASILEIRA"?
Ricardo Rosas
Essa é uma questão que tenho me posto ultimamente e tenho tentado pensar esse tema, uma vez que boa parte das teorias e práticas ativistas por aqui parecem sempre vir de fora. Conhecemos os Provos, Luther Blissett, Hakim Bey, entre outros, mas pouco conhecemos de teorias ou práticas usadas por aqui. Será que é por que não as temos? Seremos os típicos "homens cordiais" que a tudo se conformam, como pensava o Sérgio Buarque de Holanda, ou teremos também uma tradição de pensamento contestatório brasileiro?
Teremos nossas próprias táticas? Nossas ações diretas? Se sim, quais são? Há também acaso originalidade nesse pensamento, algo como uma brasilidade própria? Não é o caso aqui de falar de um "terceiro-mundismo", uma "estética da fome", mas procurar algo que distingue nossas ações dos outros. É interessante perceber como muito dos movimentos anti-globalização desse início de milênio cultuam "bandas de samba" ou realizam "carnavais anti-capitalistas". Ora, mas não são o samba e o carnaval algo tão nosso, tão brasileiro?
Com certeza nossa tradição não é vazia. Sim, já tivemos o mini-manual do guerrilheiro urbano de Marighela, com a sizudez típica do revolucionarismo dos anos sessenta, ou os contos "gonzo" do Ari Almeida, com suas molecadas bem-humoradas. Temos também alguma noção das práticas de ação direta do MST ou dos grupos de sem-teto. Com certeza, há pouco material escrito sobre elas. E conexões mais diretas com a nossa cultura? Com nossa situação econômica, cotidiana?
Com certeza, no universo da arte brasileira poderíamos beber um pouco do parangolé e do barracão de Hélio Oiticica, assim como das "inserções em circuitos ideológicos" de Cildo Meirelles, ou ainda das experimentações de Artur Barrio ou das intervenções de coletivos dos anos 70 como 3Nós3, entre outros. E as conexões contemporâneas, onde podemos beber a realidade que nos condiz?
Se nos voltamos para a arte tecnológica, aquela que de certa forma mais se aproxima, de uma forma ou de outra, da atuais ações de ativismo de mídia, onde reconhecer essa brasilidade, que não é essencialismo ontológico, mas circunstância real de vida? Teremos talvez um vazio, tanto na criação como na teorização, mas, veja-se bem, a realidade da cultura eletrônica brasileira é muito rica, e acontece fora dos grandes circuitos de exibição. Ela está, pois, nas ruas. Acontece nos puxadinhos, nas gambiarras, nos camelôs e suas estratégias de fuga do rapa, na pirataria, nas práticas de mutirão, nos arrastões, nos bailes de tecnobrega ou funks. São essas práticas espontâneas, independentes, esses troca-trocas, que constituem talvez o que de mais rico e original nossa cibercultura, nossa cultura eletrônica tenha produzido. Elas acontecem nas brechas, nos desvãos da cibercultura oficial. Sua natureza tanto pode ser a vida cotidiana, o dia-a-dia digital e sua configuração mais real (mais real mesmo que as estatísticas sobre o Orkut ou o acesso da população à rede), quanto às práticas de contestação, de ação direta coletiva, de protesto.
Fica então uma proposta de pensar se haveria uma cultura tática brasileira, uma teoria de mídia tática ou de ativismo que pensasse nossa especificidade, nossa contribuição. Ela existirá? Já temos algo nesse sentido? É o que proponho aqui a todos que queiram contribuir nesse sentido, enviando ensaios, textos, manifestos, o que acreditarem que sejam sementes para se pensar uma teoria tática brasileira. _______________________________________________ Nettime-br mailing list Nettime-br@nettime.org http://www.nettime.org/cgi-bin/mailman/listinfo/nettime-br